quinta-feira, 12 de março de 2015

Pérola Negra

Pérola Negra
Luiz Melodia
1971

"Eu não tinha a fissura de ser artista. Gostava de tocar e de cantar, mas não pensava em ganhar a vida com música. Tive a felicidade de estar na hora e no local certos quando uma mulher que virou minha amiga, a Rose, foi morar no morro. Ela conhecia muito os baianos, Caetano, Waly Salomão, Gal, todos eles."

Rose apresentou Luiz Melodia a Waly Salomão, que frequentava o morro para ouvir samba. O ano era 1971, e o rapaz do São Carlos já tinha um passado em bandas amadoras e em concursos de rádio, além de um punhado de composições que encantaram o poeta.

Agitador cultural nato, Waly Salomão introduziu Luiz Melodia à sua trupe tropicalista, incluindo o poeta e jornalista Torquato Neto, que usou sua coluna "Geléia Geral", no jornal Última Hora, para divulgar o "negro magrinho com composições interessantes, do morro do São Carlos".

"O Waly e o Torquato ouviram meu trabalho, outras pessoas da zona sul vieram saber, fiquei amigo de algumas, vira e volta descia o morro para tocar em reuniões na casa da Suzana de Moraes, filha de Vinícius de Moraes, ou do Jards Macalé."

Nesses encontros começou a se destacar a canção "My Black, Meu Nego", que viraria "Pérola Negra" por sugestão de Waly Salomão, inspirado pelo apelido de um jovem gay da turma. O baiano, prestes a dirigir o show "Gal a Todo Vapor", instou Luiz Melodia a mostrar a "Pérola Negra" à dona do palco. 

"Fomos a ela num ensaio, peguei o violão e mostrei, e ela ficou apaixonada. Daí ficamos amigos, e ela falou: 'Vou pôr no meu disco'. Foi um acontecimento!"

De fato, a reboque do sucesso de "Gal a Todo Vapor" - que lotava ininterruptamente o Teatro Tereza Rachel, em Copacabana, e seria registrado em célebre disco ao vivo - "Pérola Negra" estourou e jogou luz sobre seu compositor Luiz Melodia.

"A gente conheceu o Luiz Melodia em 1972, por causa da gravação da Gal Costa. Foi o [arranjador] Perinho Albuquerque quem me disse que tinha um cara com umas músicas muito boas", contou o músico Roberto Menescal, àquela altura diretor artístico da principal gravadora da Música Popular Brasileira, a Philips/Phonogram.

"Saquei que já não era mais a bossa nova, a tropicália. Estavam chegando Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Fagner. Fiquei de olho nessa turma. Quando o Perinho me falou, fui sacar as músicas do Melodia e o contratei."
(Roberto Menescal)

Na época, Luiz Melodia passou a ser empresariado pelo poderoso Guilherme Araújo. "Eu tinha, de certa forma, costas bem quentes: ele tinha todo mundo, o Caetano, o Gil, a Gal. Me tornei o caçula, tinha todo um aparato em que confiei e que foi consistente."

Para um jovem desconhecido, vindo do morro, conviver com a turma do desbunde na Ipanema do amor livre e das "dunas do barato" foi um choque cultural.

"Eu era um cara à parte da situação, era um menino. Lembro que, quando a Gal, aquela mulher linda e gostosíssima, sentava na minha frente de perna aberta, eu não entendia picas. E era uma coisa natural."

Como e Quando?

"A criação de 'Pérola Negra' é uma história curiosa. Na época eu servia o exército, era bem jovem, tinha 19, 20 anos, e nem tinha terminado essa música ainda. Faltavam ainda umas pouquíssimas frases, e eu conheci o Waly Salomão, que falou o que ele achava.
Lembro que a minha grande inspiração era uma mulher negra muito bonita, irmã de um parceiro meu. E tinha também um menino gay que morava no Morro de São Carlos, apelidado de Pérola Negra, e aproveitei para prestar uma homenagem a ele.
É bem curioso, né? Eu tinha esperança de seguir carreira, mas já estava meio que pensando em arranjar emprego. Mas daí o Waly Salomão, que, na época, dirigia o show de Gal Costa, ficou encantado com o meu trabalho. Não só ele como também o Torquato Neto, que escrevia no jornal Última Hora a coluna 'Geleia Geral' e sempre comentava sobre o meu dia a dia, que eu era um compositor genial. Eu tive a sorte e a graça de conhecê-lo. Na verdade, todo esse pacote: Waly SalomãoTorquato Neto, Gal Costa cantar no show 'Gal Fatal' e ter gravado a música no disco 'Gal a Todo Vapor'.
Depois veio 'Estácio Holly Estácio', que a Maria Bethânia gravou, e, em seguida, eu gravei meu disco, 'Pérola Negra', com arranjos do Perinho Albuquerque. Achei o resultado maravilhoso, até porque eu estava começando e tudo era esplêndido. Antes de gravar o disco, eu já tinha feito shows no Teatro Opinião, as pessoas já sabiam de mim e as coisas foram acontecendo."
(Luiz Melodia)



Pérola Negra

Tente passar pelo que estou passando
Tente apagar este teu novo engano
Tente me amar pois estou de amando
Baby, te amo, nem sei se te amo

Tente usar a roupa que estou usando
Tente esquecer em que ano estamos
Arranje algum sangue, escreva num pano
Pérola Negra, te amo, te amo

Rasgue a camisa, enxugue meu pranto
Como prova de amor mostre teu novo canto
Escreva num quadro em palavras gigantes
Pérola Negra, te amo, te amo

Tente entender tudo mais sobre o sexo
Peça meu livro querendo eu te empresto
Se intere da coisa sem haver engano
Baby, te amo, nem sei se te amo
Baby, te amo, nem sei se te amo
Baby, te amo, nem sei se te amo


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